DT VI: Contribuição de Melhoria

Contribuição de Melhoria

É o tributo vinculado à atividade estatal relativa ao contribuinte, cuja obrigação tem por fato gerador a valorização de imóvel em decorrência de obra pública. Prevista no art.145, inciso III, da CF, a contribuição de melhoria é tributo justo, pois permite ao Estado equalizar o custeio de obra pública, carreando aos cidadãos que, direta ou indiretamente, tenham sido beneficiados em seu patrimônio imobiliário com a melhoria trazida por ela, contrapartida destinada a desonerar parcialmente os demais membros da coletividade. Noutros termos, não é justo que uns poucos proprietários de imóveis aufiram sozinhos e desoneradamente benefício patrimonial trazido por obra custeada por toda a sociedade.

Embora no dispositivo aludido o texto constitucional refira-se apenas à obra pública, não mais fazendo referência à valorização imobiliária, continua tal circunstância figurando como elementar do tipo tributário em exame, por ser ela da essência da contribuição de melhoria. O Supremo Tribunal Federal, por exemplo, decidiu certa feita que o recapeamento de via pública já asfaltada não autoriza a cobrança de contribuição de melhoria, por não gerar efetiva valorização imobiliária (RE nº116.148, Min. Octavio Gallotti). Na mesma linha, o Superior Tribunal Jutiça anotou que para ser válida a contribuição de melhoria, é imprescindível, além da realização de obra pública e da efetiva constatação de valorização do imóvel, a comprovação de nexo de causalidade entre esses dois fatos, ou seja, a prova de que a valorização decorreu estritamente da obra levada a efeito pelo ente tributante, a quem compete o ônus da prova (AgRg no AREsp 417697, Ministra Eliana Calmon, 2013).

Malgrado identifique-se com a taxa, por ser também tributo retributivo e baseado na correlação custo-benefício, a contribuição de melhoria tem por pressuposto fático de incidência atividade estatal inconfundível com a que autoriza a incidência da primeira.

Afastada qualquer possibilidade de confusão entre obra pública e atividade emanada de poder de polícia, distinga-se “obra pública” de “serviço público”. Obra é atividade temporária (ou que se deseja temporária), cessando no momento em que fica pronto o bem construído. Já o serviço é atividade permanente (ou que se deseja permamente). Isso porque, em relação à obra, o que atende o interesse da coletividade não é a atividade em si (frequentemente causadora de transtornos), mas o resultado da atividade, qual seja, o bem público acabado. O serviço, ao contrário, revela atividade que, em si, conduz à satisfação das necessidades coletivas, daí se extraindo o princípio administrativo da continuidade dos serviços públicos. O Supremo Tribunal Federal já declarou, por exemplo, que é inadmissível a cobrança de “taxa de pavimentação asfáltica de rua”, por configurar dita atividade obra pública e não serviço (RE nº140.779/SP, Rel. Min. Ilmar Galvão, DJ 08/09/1995, p. 28.360).

A competência para instituir e cobrar a contribuição de melhoria é comum aos entes da Federação, sendo fixada, concretamente, a partir da aferição de qual deles despendeu para a realização da obra pública.

O regramento genérico da contribuição de melhoria é encontrado nos arts.81 e 82 do CTN e no Decreto-Lei nº195/1967 (diplomas que convivem em harmonia no sistema tributário pátrio), de cujas principais normas se pode extrair que:

a) obrigação de pagar a contribuição de melhoria tem como limite global a despesa total da obra (computadas também, entre outras, despesas de estudo, projetos, fiscalização, desapropriações, administração, execução e financiamento) e como limite individual, de cada proprietário, o quantum a expressar a efetiva valorização trazida, apurando-se o valor do imóvel antes e depois da realização da obra pública (CTN, art.81, e Decreto-Lei nº195, art.4º). O STJ entende, com pertinência, que não é possível estabelecer a cobrança da contribuição de melhoria apenas dividindo o custo total da obra pelo número de unidades existentes na área beneficiada, devendo ser projetado no cálculo o fator de valorização de cada imóvel tributado (AgRg no AgRg no REsp 1.018.797, Min. Mauro Campbell Marques, 2012). Já o STF, na mesma linha, definiu que a contribuição de melhoria incide sobre o quantum da valorização imobiliária (RE 982415, Rel.  Min. Roberto Barroso, 2016);

b) a lei relativa à contribuição de melhoria deverá publicar edital contendo o memorial descritivo do projeto, o orçamento do custo da obra e a parcela do mesmo a ser financiada através da contribuição, a delimitação da zona beneficiada e o correspondente fator de absorção da valorização imobiliária (CTN, art.82, I, e Decreto-Lei nº195, art.5º); tal edital, na dicção do Superior Tribunal de Justiça, deve ser publicado previamente à cobrança, ainda que posteriormente à obra (REsp
417, Min. Américo Luz);

c) a mesma lei deverá estabelecer prazo de trinta dias para impugnação, pelos interessados, dos elementos indicados no edital aludido, regulamentando o respectivo procedimento administrativo de instrução e julgamento, sem prejuízo, naturalmente, do acesso à instância judicial (CTN, art.81, incisosII e III, e Decreto-Lei nº195, arts.6º e 7º);

d) o lançamento da contribuição de melhoria, por meio do qual o contribuinte tomará ciência dos critérios de cálculo, do montante, da forma e do prazo para o pagamento, poderá ser efetuado mesmo antes da finalização total da obra, desde que a parte acabada já tenha gerado valorização para os imóveis tributados (CTN, art.82, §2º, e Decreto-Lei nº195, art.9º);

e) o contribuinte será o proprietário do imóvel ao tempo do lançamento da contribuição, respondendo solidariamente os adquirentes e sucessores a qualquer título do imóvel; no caso de enfiteuse constituída anteriormente à vigência do Código Civil de 2002 (que proibiu novas constituições, em seu art.038), contribuinte será o enfiteuta (Decreto-Lei nº195, art.8º, caput e §1º);

f) em relação ao imóvel locado, é nula a cláusula contratual que atribua ao locatário a responsabilidade pelo pagamento da contribuição, assistindo ao locador apenas a faculdade de exigir aumento de aluguel correspondente a 10% ao ano do que tiver recolhido efetivamente (Decreto-Lei nº195, art.8º, §§2º e 3º);

g) os bens indivisos serão considerados como pertencentes a um só proprietário e àquele a quem for dirigida a tributação assistirá o direito de exigir dos condôminos as parcelas que lhes couberem (Decreto-Lei nº195, art.8º, §4º);

h) a parcela anual da contribuição de melhoria não poderá exceder a 3% do maior valor fiscal do imóvel (valor venal) atualizado, podendo o contribuinte liquidar o tributo com títulos da dívida pública, desde que emitidos especialmente para financiamento da obra pela qual foi lançado, em verdadeiro encontro de contas (compensação) tendo por base o valor nominal do título, se o preço do mercado for inferior (Decreto-Lei nº195, art.12, caput, e §4º); e

i) o contribuinte poderá deduzir, do montante a ser pago pela incidência de imposto de renda sobre o acréscimo patrimonial relacionado à valorização imobiliária decorrente de obra pública, a importância que tenha recolhido a título de contribuição de melhoria (Decreto-Lei nº195,
17).

O rol de obras públicas passíveis de custeio por meio de contribuição de melhoria – desde que delas decorra valorização imobiliária, naturalmente – é taxativo e bastante abrangente, encontrando-se no art.2º do Decreto-Lei nº195/1967. Dele constam:

I – abertura, alargamento, pavimentação, iluminação, arborização, esgotos pluviais e outros melhoramentos de praças e vias públicas;

II – construção e ampliação de parques, campos de desportos, pontes, túneis e viadutos;

III – construção ou ampliação de sistemas de trânsito rápido inclusive todas as obras e edificações necessárias ao funcionamento do sistema;

IV – serviços e obras de abastecimento de água potável, esgotos, instalações de redes elétricas, telefônicas, transportes e comunicações em geral ou de suprimento de gás, funiculares, ascensores e instalações de comodidade pública;

V – proteção contra secas, inundações, erosão, ressacas, e de saneamento de drenagem em geral, diques, cais, desobstrução de barras, portos e canais, retificação e regularização de cursos d’água e irrigação;

VI – construção de estradas de ferro e construção, pavimentação e melhoramento de estradas de rodagem;

VII – construção de aeródromos e aeroportos e seus acessos;

VIII – aterros e realizações de embelezamento em geral, inclusive desapropriações em desenvolvimento de plano de aspecto paisagístico.

Embora o Decreto-Lei nº195/1967, em seus arts.2º, caput, e 3º, §3º, limite a incidência da contribuição de melhoria aos imóveis do domínio privado, cremos que tal restrição, veiculada em norma, no particular, de caráter específico, só deve alcançar a tributação pela União Federal. Com efeito, haveria nítida violação da autonomia dos demais entes (Estados, Distrito Federal e Municípios) se lhes fosse tolhida, mediante pretensa norma geral editada pela União Federal, a possibilidade de fazer incidir contribuição de melhoria sobre imóveis do domínio público. Não há limitação a impedir dita tributação, certo que a imunidade recíproca que vigora entre os entes federativos, prevista no art.150, inciso VI, da Constituição, refere-se exclusivamente à figura do imposto. Não fosse bastante, a Lei Maior, no art.151, inciso III, veda à União a concessão de isenção de tributos que não sejam de sua competência (isenção heterônoma).

Em julgado relevante sobre a contribuição de melhoria, decidiu o Supremo Tribunal Federal que “o particular que assumiu por contrato a obrigação de ressarcir a sociedade de economia mista executora dos custos de obra pública de seu interesse não pode opor à validade da obrigação livremente contraída a possibilidade, em tese, da instituição para a hipótese de contribuição de melhoria” (RE nº236.310, Min. Sepúlveda Pertence). Outrossim, assentou a Suprema Corte que a valorização imobiliária trazida por obra pública em imóvel esbulhado pelo Estado não pode ser abatida do montante correspondente à indenização devida ao expropriado calculada em ação na qual resta caracterizada a desapropriação indireta, devendo o custo parcial da obra ser recuperado necessariamente por meio de contribuição de melhoria (RE nº109.585, Min. Célio Borja).

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